Os cães, frequentemente chamados de “melhores amigos do homem”, estão a assumir um novo papel nas pesquisas científicas como “sentinelas” do bem-estar humano. Este conceito, abordado por investigadores num estudo recente, sugere que os cães de estimação podem refletir, de forma significativa, a qualidade de vida dos seus donos, atuando como indicadores da saúde humana.
A estreita convivência entre cães e humanos faz com que ambos compartilhem não apenas espaços, mas também ambientes e rotinas diárias. Os investigadores afirmam que essa ligação permite que os cães se tornem reflexos da saúde e do bem-estar dos seus donos. A saúde de um cão pode, portanto, ser um espelho da saúde humana, refletindo as condições do ambiente onde ambos vivem.
De acordo com um artigo recente publicado na revista Science, os cães estão “claramente posicionados para serem sentinelas da saúde pública, do bem-estar social e da saúde dos indivíduos”. Isso significa que, ao analisar a saúde dos cães, podemos obter insights valiosos sobre a saúde dos humanos que convivem com eles. Por exemplo, a exposição a toxinas ambientais, como a poluição do ar, afeta tanto os cães quanto os humanos. A baixa qualidade do ar pode levar a problemas respiratórios em ambos, além de estar associada a riscos de doenças graves, como o cancro.
Cães e humanos partilham os mesmos ambientes, o que os expõe a fatores prejudiciais semelhantes, como toxinas no ar. Estas toxinas não só prejudicam a saúde física, mas também podem impactar a saúde mental e a função cognitiva. Como os cães interagem de forma próxima e intensa com o ambiente — com os seus narizes, patas e bocas a tocarem quase tudo — eles acabam por ser especialmente vulneráveis aos poluentes invisíveis. Esta vulnerabilidade faz com que sejam indicadores precoces dos riscos ambientais que também podem afetar os humanos.
Os investigadores também apontam que a raça de um cão pode refletir o status socioeconómico do seu dono. Infelizmente, certas raças podem limitar o acesso à habitação em determinadas áreas, o que espelha desigualdades sociais enfrentadas pelos donos. A presença de companheirismo, recursos, cuidados e até mesmo a idade dos cães e humanos compartilham paralelos, sugerindo que as condições de vida de um cão podem ser uma extensão das condições de vida do seu dono.
Para aprofundar a compreensão desta conexão entre a saúde canina e humana, os investigadores Courtney Sexton e Audrey Ruple destacam a necessidade de mais dados. Eles sugerem o uso de tecnologia, como apps e dispositivos de monitorização, para recolher informações em larga escala sobre os cães e, consequentemente, sobre os seus donos. Dados de bases veterinárias, demografia local e qualidade do ar já estão disponíveis, mas faltam medidas padronizadas de notificação sobre a saúde dos cães para que se possa desenhar um quadro mais completo do bem-estar humano.
Os autores do estudo defendem que a medicina veterinária deve começar a incorporar variáveis demográficas dos proprietários de cães para preencher a lacuna entre as espécies. Isso não só beneficiaria a saúde dos cães, mas também forneceria insights valiosos para melhorar a saúde pública humana.
Os cães, com o seu companheirismo incondicional e sensibilidade ao ambiente, podem ser mais do que apenas animais de estimação. Eles podem, na verdade, ser nossos parceiros na manutenção e monitorização da saúde, servindo como sentinelas silenciosas do bem-estar humano.
